Escrito...

A minha literatura diz e não diz: diz porque, no momento de aspersão inspiradora, (quase) se nota uma fisgada de incomodidade, uma crítica sutil, para que a poesia floresça... Não diz porque as inquietações são dialéticas - parte de cada leitor -, o que se vive, sonha, pensa e sente...

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Uma história de boto

“O boto é um animal manso e brincalhão”, exemplifica um dicionário. De fato, ouvi casos no interior onde trabalho que denotam puras fanfarrices desses cetáceos pregando peças na imaginação das pessoas.
E “...altamente inteligente”, diz outro dicionário. Que valha a história que se segue.
          O casal de namorados escolheu o trapiche da vila para efetivar o ato que todos comentavam que eles já tinham realizado. “Se há a fama, que haja o feito”.
          A noite não poderia estar melhor, propícia para a defloração da planta que se vê em véus: com aquele céu límpido, mas ainda sem estrelas. Um desejo secreto pulsava naquele momento. Do mar soprava uma brisa constante e refrescante. Nenhum barco, nenhum fumante dessas bandas dando uma de pescador para atrapalhar. A menina exalava um calor sensual, e já quase nua esperava pelo gesto instintivo do rapaz que lhe ganhara a feição. Foi quando um estouro de água perto da escada bem debaixo deles deixou escapar um “chuá” que fez o casal mostrarem o amarelo dos pés, interrompendo o ato. O comentário na vila foi de que um boto tinha desaprovado aquela união porque já era enamorado da moça.
          Zé Bira foi quem alimentou a história dias consecutivos. O povo aceitou a explicação, mas teve quem seguisse o fato de que Zé Bira fora antes rejeitado pela moça, que não o quis paquerar. Isso foi antes. Passaram-se anos.
          E essa história de um boto rondando a casa da menina à noite veio ganhando ares.
         A dita cuja, depois de aparecer grávida do namorado, foi morar com ele numa casola de paxiúba na beira do igarapé.. De fato o casal, logo depois do ocorrido naquela noite, não tardou a entrar na vida sexual que tanto desejavam. Tiveram uma linda filha que mais parecia uma irmã gêmea da mãe quando criança, diziam. Tudo se ia como se vai.
          E a vida se passava pacatamente quando a mulher começou a definhar: médico não deu jeito! A história do boto que a assombrou quando solteira veio à tona: “O boto está visitando sua mulher, homem” diziam os amigos. O homem armou uma para pegar esse boto. Emprestou a espingarda do primo de Zé Bira e fingiu ir lanternar, ficando à espreita. Chegou a ouvir algo suspeito na água do igarapé perto da casa; o homem preparou a espingarda, no entanto nada viu. Repetiu a infeliz artimanha por mais algumas vezes e chegou a conclusão de que sua mulher estava mesmo era doente: mas nem remédio de médico nem de mestre! Faziam-lhe tudo quanto era chá e banhos, nenhum efeito; e o imaginário coletivo concluiu que fora o boto quem malvadou dela.
          Ah, qual mistério se esconde por detrás da índole de tão famigerado bicho?

Um comentário:

  1. ola jonas
    sou pontapedrense tb e adoro minha terra querida
    mas ando meio triste com a situação em que se encontra nossa querida Ponta de Pedras.

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